O estado do Rio de Janeiro é o berço das ferrovias Brasileiras ! Aqui foi construída a primeira ferrovia do país, e por trilhos de diversas companhias se alcançava quase todas as localidades do estado e outras capitais do país, como São Paulo - SP, Belo Horizonte - MG e Vitória - ES, entre outras. Milhares e milhares de quilômetros de ferrovias, servindo à população, escoando a produção do interior para os portos do litoral ...
Trecho da Linha do Litoral da EF Leopoldina, próximo à Venda das Pedras
Infelizmente, este texto não se aplica ao tempo atual. O estado do Rio de Janeiro, de berço das ferrovias, passou a ser o túmulo das ferrovias. Depois da desativação inconsequente, irresponsável e insensata de milhares de quilômetros através da RFFSA e sua comissão de erradicação de ramais anti-econômicos, erradicação esta que durou décadas (de 1950 à 1980), mesmo após a extinção da Rede, o extermínio de trilhos continua.
Pontilhão ferroviário e mato por todos os lados. Linha do Litoral da EF Leopoldina
Além das linhas e trilhos, serviços ferroviários de passageiros como os trens ligando Niterói a Visconde de Itaboraí, o trem Barrinha que ligava Japeri a Barra do Piraí, o Vera Cruz (Rio de Janeiro x Belo Horizonte), o Santa Cruz (Rio de Janeiro x São Paulo), o Cacique (Rio de Janeiro x Campos dos Goytacazes x Vitória) e tantos outros, foram sistematicamente sendo desativados através da costumeira prática de torna-los inviáveis: sem manutenção, sem modernização, sem investimento, o serviço torna-se impossível de funcionar, sem segurança, sem pontualidade, sem condições. Neste meio, quase o Bonde de Santa Teresa entra também, após sofrer um acidente grave e ter o funcionamento interrompido. Devido à pressão popular, o sistema voltou e ainda funciona parcialmente.
Por incrível que pareça, por aqui já passaram trens ligando o Rio de Janeiro à região Norte Fluminense e ao estado do Espírito Santo. Aliás, esta ERA a única ligação ferroviária entre estas regiões do estado ...
Sem um trem rodando pelas ferrovias, tanto trens de cargas como de passageiros, as vias acabam sendo pouco a pouco massacradas, invadidas, tomadas por mato e árvores, ou absurdamente tendo os trilhos e dormentes (e até a brita !) roubados. Os membros da AF Trilhos do Rio já presenciaram muitas coisas tristes, absurdas, desoladoras ... mas a cada caminhada, a cada quilômetro de linha explorado, a situação vai ficando cada vez pior.
Dia 10 de julho de 2016. Enquanto muitos assistiam à final da Eurocopa ou a qualquer outra atração pela televisão, um dos membros da AFTR percorreu sozinho o trecho da Linha do Litoral da antiga Estrada de Ferro Leopoldina e nos trouxe um verdadeiro dossiê da situação calamitosa, trágica, triste e chocante desta importante ferrovia que sucumbe a passos largos. Após chuvas fortes que arrastaram um pontilhão no bairro Engenho Velho, em Itaboraí, o trecho entre Vendas das Pedras e Visconde de Itaboraí ficou isolado. Se tem notícia apenas da circulação de veículos ferroviários (Autos de linha) no trecho após Tanguá em direção ao Norte Fluminense. De Niterói à São Gonçalo a linha foi erradicada, tendo os trilhos removidos pelo próprio governo. De São Gonçalo à Visconde de Itaboraí, diversos trechos foram removidos. Trem, Auto de Linha, Velocípede, nada circula no trecho prometido para receber a lendária Linha 3 do Metrô. Em Visconde de Itaboraí, entroncamento que recebia também a linha da Ligação vinda de Saracuruna e que levou vários anos para ser construída em terreno pantanoso e com diversas e verdadeiras obras de arte da engenharia brasileira, também não tem trilhos em boa parte do percurso já há algum tempo. Ou seja: não existe mais a possibilidade de se ligar o Leste e o Oeste do estado do Rio de Janeiro por trilhos.
Mas isso ainda não é tudo ... a situação está piorando ... a Leopoldina está agonizando. Preparem-se, tomem um calmante, e vejam as fotos abaixo:
Em um pequeno vale, o leito ferroviário foi transformado em depósito de lixo
A estação de Vendas das Pedras, original da ferrovia. Tornou-se moradia e aos poucos vai sendo descaracterizada, apesar de mantida pelos moradores, ex-trabalhadores da RFFSA
Obra irregular afeta a estabilidade da linha
Em diversos trechos, como este, os trilhos foram cortados e roubados
Em outros, habitações se aproximam demais da linha
Trecho sem trilhos e sendo tomado pela mata
Mais um trecho sem trilhos
Placas novas de sinalização de Passagem de Nível. Inúteis, pois não há nem trilhos, quanto mais um trem pra atravessar a estrada ...
Chegando em Porto das Caixas. O descampado ao fundo era o leito da EF Cantagalo. Em primeiro plano, a linha do Litoral da EF Leopoldina, tendo o mesmo destino da outra ferrovia ...
Casa de turma e antiga caixa d'água da ferrovia em Porto das Caixas,
próximas de onde era a estação. Em 2011 caminhamos deste ponto até
Alcântara, e a situação era esta abaixo ...
Porto das Caixas em 2011
Cruzando a primeira PN entre Porto das Caixas e Visconde de Itaboraí
A situação não muda. A destruição se repete
Sem trilhos, sem linha, mas com invasões e cercas bloqueando propriedade da União
A estação de Visconde de Itaboraí. Mais abandonada do que nunca ...
E além de abandonada, invadida !
Trecho percorrido hoje: a linha em amarelo é o percurso total. Os trechos em vermelho são onde não tem mais trilhos.
Infelizmente esta é a verdade. Estão dizimando nossas ferrovias. Cabe a nós mostrar a dura realidade, ser fortes e buscar medidas a serem tomadas para que isso se reverta. Para muitos, estamos dando murros em ponta de faca. Ok, um dia a faca quebra ...
Quero agradecer imensamente ao nosso amigo Cleiton Pierucinni pela coragem, disposição e gentileza em fornecer as imagens que compõe esta publicação. Muito obrigado.